Produtos probióticos são aqueles que contém culturas adicionadas reconhecidas como probióticas. As indústrias de laticínios podem produzir derivados lácteos considerados probióticos como o leite fermentado.
A fermentação de alimentos e bebidas é uma atividade humana muito antiga, que possivelmente se originou no período Neolítico, ou seja, a cerca de 14.000 anos. Ao longo do tempo, certamente observamos que nem toda fermentação “dá certo”, já que algumas vezes azedam produtos de uma forma não desejável, deixando-os impróprios para consumo.
Mas algumas são muito favoráveis e permitem a obtenção de alimentos/bebidas que duram mais e são muito atrativas do ponto de vista sensorial, como quando são obtidos cerveja, vinho, vegetais fermentados e iogurtes, para dar alguns exemplos, já que existem mais de 5 mil tipos de produtos fermentados que podem fazer parte do nosso cardápio.
Além de agradar nosso paladar muitas propriedades terapêuticas têm sido descritas para o consumo de produtos fermentados, o que pode contribuir para qualidade de vida, saúde global e longevidade. Diversos são os produtos lácteos que contém microrganismos em sua formulação, o que pode gerar incertezas de alguns consumidores quanto sua formulação, classificação e também quais benefícios aquele produto pode gerar para sua saúde.
“Todo leite fermentado é probiótico?” “Necessariamente todos os produtos lácteos fermentados precisam ter microrganismos vivos?” “Iogurte é considerado probiótico?”, certamente grande parte dos consumidores já se questionaram em relação a isso no momento da compra. Logo, são dúvidas importantes a ser esclarecidas.
Atualmente, produtos fermentados podem ser definidos como “alimentos feitos a partir do crescimento microbiano desejado com conversão enzimática dos componentes alimentares”. O termo exige a presença de microrganismos no processo de fabricação do alimento, porém não necessita do microrganismo vivo no momento do consumo.
Além disso, produtos fermentados podem conter etapas de processamento após a fermentação a fim de reduzir ou eliminar totalmente o fermento utilizado. Em contrapartida, produtos probióticos são aqueles em que se há necessidade do microrganismo vivo e em quantidade suficiente (viabilidade) durante toda validade comercial do produto.
Além disso, para classificar um produto como “alimento probiótico” é necessário que as culturas nele adicionadas sejam reconhecidas como probióticas com evidências científicas, que seja seguro e tenha efeitos benéficos para saúde bem definidos. Logo, essa é a primeira diferença que ajuda a entender sobre a distinção desses dois produtos.
Por outro lado, muitos alimentos fermentados não contém as culturas fermentadoras presentes no produto final ou, mesmo que presentes, elas não estão mais ativas. Exemplos disso são o pão, vinho, muitas cervejas e bebidas destiladas, vegetais fermentados enlatados, vinagre, café e chocolate.
Vendo a necessidade desse esclarecimento, a Associação Científica Internacional de Probióticos e Probióticos (International Scientific Association for Probiotics and Prebiotics) reuniu diversos especialistas para discutir e definir novos conceitos que ajudem a diferenciar produtos fermentados e probióticos, bem como outros assuntos de interesse na saúde humana, baseados em comprovações científicas (Marco et al., 2021).
Especificamente sobre iogurtes e outros leites fermentados a publicação da International Scientific Association for Probiotics and Prebiotics (ISAPP) destacou que o emprego dos starters clássicos para obtenção de iogurtes (Lactobacillus delbrueccki subsp. bulgaricus e Streptococcus thermophilus) não podem conferir ao produto o status de probiótico.
Para assim classificar um iogurte se faz necessário que as culturas presentes estejam classificadas em seu genoma até nível de cepa (e não apenas até nível de espécie). Isso significa dizer que precisamos conhecer detalhadamente as culturas que foram empregadas para poder buscar nas publicações científicas informações específicas para atestar sua sobrevivência à digestão e propriedades promotoras de saúde.
Produtos fermentados que contenham “alimento probiótico” em seu rótulo, precisam ter em sua composição microrganismos que de fato sejam classificados como probióticos, e em quantidades suficientes no momento do consumo. Caso contrário, a utilização do termo “probiótico” é feita de forma equivocada.
Para a fabricação de produtos fermentados, diversos são os microrganismos que podem ser utilizados, desde bactérias, bolores e leveduras. No leite e seus derivados, Bactérias Ácido Láticas (BAL) são as mais utilizadas, essas bactérias utilizam a lactose como principal substrato com posterior formação de ácido lático.
Porém, outros microrganismos também podem ser utilizados, principalmente relacionados à produção de queijos maturados. Em alguns casos, um produto fermentado pode conter mais de uma bactéria (extremamente comum em queijos e no iogurte), ou até mesmo um consorcio entre bactérias e leveduras (por exemplo, Kefir).
Queijos maturados são ótimos exemplos de produtos fermentados que não necessariamente o microrganismo precisa estar viável e em quantidade suficiente no momento do consumo, uma vez que nesses queijos, principalmente de longa maturação, tem sua carga microbiana reduzida ao longo do tempo, principalmente das BAL's.
Em termos tecnológicos, o que diferem produtos fermentados de produtos probióticos é que para o processamento dos fermentados, durante a fabricação é importante controlar fatores como temperatura, pH, tempo e substratos, afim de que a fermentação ocorra da melhor maneira, e em alguns casos não há necessidade do armazenamento em baixas temperaturas.
Já nos produtos probióticos, como não há necessidade deste processo, o principal fator a ser controlado é a viabilidade do probiótico, uma vez que precisa ser adicionado em quantidade suficiente para ter sua viabilidade em quantidade suficiente durante a estocagem, que precisa ser feita em baixas temperaturas.
Existe ainda um terceiro grupo, os chamados“alimentos fermentados probióticos”, os quais além das cepas probióticas, possuem microrganismos responsáveis pela fermentação e melhoria nas características sensoriais do produto.
Tabela 1. Distinção entre os termos probióticos, alimento fermentado e alimento fermentado probiótico.
Adaptado de Marco et al. (2021).
Importante ressaltar que produtos fermentados também são extremamente importantes para promoção e manutenção da saúde. Diversos estudos com leites fermentados e queijos demonstram a importância desses alimentos no combate à diversas doenças aumento da resposta imune (Chen et al., 2020; Gomi et al., 2015; Kimoto-Nira et al., 2014; Panchal, Hati e Sakure, 2020; Yan et al., 2020).
Além disso, possuem papel fundamental na melhoria da digestibilidade de determinados alimentos, uma vez que degradam nutrientes presentes no alimento facilitando sua absorção pelo organismo.
Alimentos fermentados, probióticos e fermentados probióticos são de grande importância tanto para os consumidores, por gerarem benefícios a saúde com diversificação sensorial, e também para indústria, uma vez que são produtos altamente consumidos e possibilitam inovação, atingindo assim maior número de pessoas e agregando valor aos produtos.
Dessa forma, o conhecimento dos consumidores sobre a diferença de suas classificações é de extrema importância, uma vez que tendo conhecimento de suas particularidades, a decisão da compra pode ser facilitada.
Autores
Ramon S. Rocha, Programa de Pós-Graduação em Hig. Vet. E Proc. Tec. de POA, Faculdade de Veterinária,Universidade Federal Fluminense – UFF, Niterói, RJ e Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Departamento de Alimentos, Rio de Janeiro, RJ
Adriano G. Cruz, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Departamento de Alimentos, Rio de Janeiro, RJ
Adriane Antunes, LLPP – Laboratório de Lácteos, Probióticos e Prebióticos, Faculdade de Ciências Aplicadas – FCA/UNICAMP
Referências
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Gomi, A., Iino, T., Nonaka, C., Miyazaki, K., Ishikawa, F. Health benefits of fermented milk containing Bifidobacterium bifidum YIT 10347 on gastric symptoms in adults. Journal of Dairy Science, v.98, n.4, p.2277–2283, 2015.
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Marco, M.L.; Sanders, M.E.; Ganzle, M.; Arrieta, M.C.; Cotter, P.D.; Vuyst, L.D.; Hill, C.; Holzapfel, W.; Lebeer, S.; Merenstein, D.; Reid, G.; Wolfe, B.E.; Hutkins, R. The International Scientific Association for Probiotics and Prebiotics (ISAPP) consensus statement on fermented foods. Nature Reviews Gastroenterol Hepatol, 2021.
Panchal, G., Hati, S., Sakure, A. Characterization and production of novel antioxidative peptides derived from fermented goat milk by L. fermentum. LWT, 108887, 2020.
Sperry, M. F., Silva, H. L. A., Balthazar, C. F., Esmerino, E. A., Verruck, S., Prudencio, E. S., Neto, R.P.C., Tavares, M.I.B., Peixoto, J.C., Nazzaro, F., Rocha, R.S., Moraes, J., Gomes, A.S.G., Raices, R.S.L, Silva, M.C., Granato, D., Pimentel, T.C, Freitas, M.Q., Cruz, A. G. Probiotic Minas Frescal cheese added with L. casei 01: Physicochemical and bioactivity characterization and effects on hematological/biochemical parameters of hypertensive overweighted women – A randomized double-blind pilot trial. Journal of Functional Foods, v.45, p.435–443, 2018.
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