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A produção brasileira de leite estagnou?

POR MATHEUS NAPOLITANO

PANORAMA DE MERCADO

EM 04/06/2024

10 MIN DE LEITURA

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Enquanto o agro brasileiro vê a produção de algumas de suas commodities em forte crescimento e renovando recordes nos últimos anos, a produção de leite parece que estacionou. Segundo dados do IBGE, a produção brasileira de leite, que vinha em um crescimento quase que linear até 2014, vem andando de lado na última década, como mostra o gráfico 1.

Gráfico 1. Captação anual de leite no Brasil (bilhões de litros)

Captação anual de leite no Brasil (bilhões de litros)
Fonte: IBGE – elaborado pelo MilkPoint Mercado

No gráfico 2, podemos observar o índice de crescimento entre 2013 e 2023 para produção de alguns das principais commodities produzidas pela agropecuária brasileira.

Gráfico 2. Crescimento anual da produção total (2013 = 100)

Crescimento anual da produção total (2013 = 100)
Fonte: IBGE e CONAB - elaborado pelo MilkPoint Mercado

Nesse cenário, fica a pergunta: por que a produção de leite está patinando?

Como em quase tudo na vida, os resultados são reflexos de diversos fatores. Vamos discutir alguns desses pontos e levantar caminhos para a possível retomada do crescimento do leite.

A competição com outras culturas

Como visto no gráfico 2, o leite tem assistido outras produções decolarem. Em maior ou menor grau, todas essas produções estão conectadas - ora atuando de forma sinérgica, ora de forma competitiva. Do lado da competição, o leite tem perdido a disputa por um dos recursos mais importantes (se não o mais importante) das atividades agrícolas: a terra.

A terra é um recurso finito. Portanto, as produções que se mostrarem mais competitivas economicamente na sua utilização tendem a ganhar mais espaço.

Apesar de não haver dados consolidados da área utilizada para produção de leite no Brasil, podemos observar abaixo a expansão da área plantada de milho e soja nos últimos anos, que são 2 culturas que têm substituído “áreas de leite” em diversas regiões.

Gráfico 3. Área plantada de milho e soja (milhões de hectares)

Área plantada de milho e soja (milhões de hectares)
Fonte: Conab - elaborado pelo MilkPoint Mercado

Uma das regiões que mais tem sentido os efeitos dessa dinâmica de substituição das áreas de produção de leite por produção de grãos é o estado de Goiás. No gráfico 4, podemos observar a evolução dos últimos anos, em base 100, para as áreas de plantio de milho e soja em relação ao crescimento da captação de leite no estado.

Gráfico 4. Goiás - Área plantada de milho e soja vs captação anual de leite (2013 = 100)

Goiás - Área plantada de milho e soja vs captação anual de leite (2013 = 100)
Fonte: Conab e IBGE – elaborado pelo MilkPoint Mercado

Essa ampliação da área de grãos em locais que anteriormente produziam leite, em muitas das vezes é realizada via arrendamento das terras. Abaixo, podemos observar a margem bruta de um grupo de produtores de leite em Goiás vs o preço médio estimado do valor de arrendamento da terra na região para o mesmo período.

Gráfico 5. Rentabilidade da produção de leite vs arrendamento para soja em 2019 - GO (R$/ha/ano)

Rentabilidade da produção de leite vs arrendamento para soja em 2019 - GO (R$/ha/ano)
Fonte: Diagnóstico da cadeia láctea do estado de Goiás 2019 - adaptado e elaborado pelo MilkPoint Mercado.

Então, podemos afirmar que é mais vantajoso arrendar do que produzir leite? Nem sempre.

O próprio gráfico 4 mostra que alguns produtores obtêm desempenho bastante superior ao do custo de oportunidade com arrendamento. Em alguns casos (produtores “I” e “K”), com margens 3x superior ao do arrendamento para soja.

Por outro lado, grande parte dos produtores analisados apresentam desempenho mais baixo. E essas fazendas produtoras de leite menos eficientes estão (e devem continuar) perdendo espaço para outros negócios que se mostrem mais lucrativos para o produtor.

A eficiência produtiva do leite

Não é novidade para ninguém que o Brasil deixa a desejar em diversos aspectos no que tange a eficiência produtiva do leite. Em termos de qualidade do leite, se tratando de CCS, o Brasil aparentemente não saiu do lugar na última década, como pode ser visto no gráfico 6.

Gráfico 6. Evolução da qualidade do leite no Brasil: CCS e CPP

Evolução da qualidade do leite no Brasil: CCS e CPP
Fonte: Mapa/Observatório da qualidade do leite

Esses fatores limitam a competitividade da indústria, impactando em toda a cadeia.

Em relação à produção de sólidos, o Brasil também apresenta desempenho bem inferior a países que demostram maior eficiência, inclusive dos seus principais vizinhos – que em alguns momentos, são seus concorrentes.

Gráfico 7. Concentração de proteína e gordura no leite em 2023 (Uruguai, Argentina e Brasil)

Concentração de proteína e gordura no leite em 2023 (Uruguai, Argentina e Brasil)
Fonte: Magyp, Inale e MilkPoint (Quem Produz o Leite Brasileiro?) - elaborado pelo MilkPoint Mercado.

Além de ainda obtermos baixos níveis de produção de sólidos, a principal preocupação é o fato de não termos evoluído praticamente nada nesse quesito nos últimos anos, conforme mostra o gráfico 8.

Gráfico 8. Evolução do teor de sólidos no Brasil (%)

Evolução do teor de sólidos no Brasil (%)
Fonte: Programa Nacional de Qualidade do Leite – PNQL (SDA/MAPA)

Além da questão da eficiência, outro grande desafio que o produtor de leite tem enfrentado nos últimos anos é o forte aumento do custo de produção.

O aumento do preço do leite não tem compensado os custos

Ao fazer o comparativo entre o indicador de inflação do leite (ICPleite), com 2 dos principais indicadores de inflação do mercado (IPCA e IGP-DI), vemos que o aumento dos custos para produção de leite foi superior ao aumento dos custos medidos pelos demais indicadores. Dessa forma, no médio prazo, percebe-se que o preço do leite não conseguiu ter ganhos significativos sobre os aumentos dos custos.

Gráfico 9. Preço do leite vs indicadores de inflação (jan 2007 = 100)

Preço do leite vs indicadores de inflação (jan 2007 = 100)
Fonte: IBGE, Embrapa e FGV - elaborado pelo MilkPoint Mercado

Assim, ao deflacionar o preço do leite pelo seu indicador de inflação de custo de produção (ICPLeite), é possível notar que no intervalo de 2007 a 2023 a tendência foi próxima à estabilidade.

Gráfico 10. Preço do leite - Média BR CEPEA (deflacionado pelo ICP-Leite)

Preço do leite - Média BR CEPEA (deflacionado pelo ICP-Leite)
Fonte: CEPEA e Embrapa - elaborado pelo MilkPoint Mercado

Entretanto, apesar de no período completo a tendência ser de estagnação, há 2 fases da série em que os comportamentos são diferentes. De 2007 a 2014, a tendência era de diminuição. E a partir de 2015, a tendência se tornou de crescimento.

Gráfico 11. Preço do leite dividido em 2 períodos - Média BR CEPEA (deflacionado pelo ICP-Leite)

Preço do leite dividido em 2 períodos - Média BR CEPEA (deflacionado pelo ICP-Leite)

Ou seja, vemos que a partir de 2015 a tendência para o preço do leite começou a ser de crescimento. Mas, não coincidentemente, a partir de 2015 é o período que a produção de leite começou a estagnar.

Um dos fatores que ajuda a explicar esse contrassenso é a volatilidade do preço do leite nos últimos anos.

Apesar de mostrar tendência de alta, o período 2 apresenta uma volatilidade superior entre os meses em relação ao período 1. Se analisado o desvio padrão das 2 séries, percebe-se que o período 1 apresenta um desvio padrão mensal de 0,25 vs 0,33 do período 2. Anualmente, de 2015 a 2013 o desvio padrão foi de 0,23, enquanto que no período 1 foi de 0,15;

Uma maior volatilidade do preço do leite traz maiores níveis de incertezas para o produtor, além de exigir uma gestão estratégica e de fluxo de caixa mais precisa pelo gestor da atividade, aspectos discutidos por Expedito Netto, no último Fórum MilkPoint Mercado.

A aversão do produtor à alta volatilidade e incerteza de preços, também foi evidenciado pelo Diagnóstico do Leite de Goiás, que mostrou que os produtores do estado consideram esses 2 fatores como problemas maiores em relação ao “preço baixo” do leite.

Figura 1: Pesquisa sobre o maior desafio na produção de leite

Pesquisa sobre o maior desafio na produção de leite
Fonte: Diagnóstico do Leite de Goiás, 2019

Os dados acima indicam que alternativas para gerar maior previsibilidade do preço ao produtor e menor oscilação entre os meses, tendem a ser caminhos para fortalecer a produção de leite no Brasil.

Nesse cenário de competição com outras culturas, desafios de eficiência e dificuldades em relação a eficiência financeira do negócio, o leite brasileiro ainda tem enfrentado um outro grande concorrente, especialmente no passado recente: as importações.

As importações

Ao analisar a competitividade das importações em relação ao produto local, um dos fatores mais importantes é a taxa de câmbio.

Se de um lado, o aumento da taxa de câmbio pode tornar o produto importado mais caro no curto prazo. Do outro, o aumento do câmbio eleva o custo de produção no Brasil, que precisa ser acompanhado de aumento do preço do leite e, consequentemente, aumenta o diferencial de preço do leite brasileiro em relação a outros mercados - estimulando as importações.

Gráfico 12. Índice da Taxa de Câmbio Real (R$/dólar)

Índice da Taxa de Câmbio Real (R$/dólar)
Fonte: Banco Central - elaborado pelo MilkPoint Mercado

Esse forte aumento do câmbio a partir de 2019 colaborou para o aumento do custo de produção de leite, evidenciado pelo ICPLeite, no gráfico 6. Além disso, os outros pontos discutidos anteriormente, especialmente em relação à eficiência produtiva, fazem com que o preço do leite brasileiro fique superior ao de outros mercados - especialmente, da Argentina e do Uruguai.

Gráfico 13. Preço do leite em diferentes países (USD/kg)

Preço do leite em diferentes países (USD/kg)
*Preço por litro corrigidos para teor de sólidos
Fonte: Inale, MAGyP, USDA, OCLA

No gráfico acima, percebe-se que a partir de abril/2022 o preço do leite brasileiro ficou bem mais caro se comparado aos principais países exportadores. Desde então, as importações foram continuamente estimuladas, refletindo no maior volume anual de importações de toda a série histórica.

Gráfico 14. Importação anual de lácteos em equivalente leite (milhões de litros/anos)

Importação anual de lácteos em equivalente leite (milhões de litros/anos)
Fonte: Secretaria de Comércio Exterior - elaborado pelo MilkPoint Mercado

Apesar do alto volume de importações, o outro lado da balança de mercado também tem deixado a desejar: o consumo.

O consumo tem deixado a desejar

Ao analisar o consumo per capita de lácteos nos últimos anos, vemos também uma estagnação, que mostram que as importações não “comeram” a parcela de crescimento do consumo.

Gráfico 15. Consumo de leite anual per capita (litros/pessoa/ano)

Consumo de leite anual per capita (litros/pessoa/ano)
Fonte: IBGE - elaborado pelo MilkPoint Mercado

Dessa forma, o consumo de lácteos deve continuar a ser estimulado, o que poderia causar um estímulo mais forte do lado da oferta.

E quais caminhos podemos seguir para estimular significativamente o consumo:

  • Aumento de vendas para outros mercados (exportações): esse é um sonho antigo e distante do setor. Apesar de o Brasil aproveitar algumas raras janelas de exportações ao longo dos anos, o nosso país precisa ainda evoluir bastante para se consolidar como um player exportador de lácteos. 
     
  • Crescimento da demanda puxado pelo crescimento populacional: mesmo se estagnado o consumo per capita, o crescimento populacional poderia estimular a oferta total. Entretanto, o Brasil parece não estar caminhando nesse sentido. O último censo populacional, divulgado no ano passado, foi uma grande surpresa para todo o mercado, ao evidenciar a forte desaceleração do crescimento demográfico brasileiro.
     
  • Crescimento do consumo per capita: este parece ser o caminho mais factível de curto e médio prazo. Se comparado com nossos vizinhos (Argentina e Uruguai) e com regiões desenvolvidas, como Estados Unidos e Europa, vemos que ainda há grande espaço para elevação do consumo per capita de lácteos no Brasil. Além disso, o crescimento sustentável da economia brasileira e a elevação do poder de compra dos lácteos (que passam também pelos aspectos de competitividade e eficiência da produção) podem contribuir.

Portanto, vemos que são diversos os desafios que têm travado a produção de leite no Brasil, e abordamos somente alguns deles aqui. Apesar desse passado recente pouco positivo, é indiscutível que ainda temos muito espaço para crescer.

O Brasil tem um dos maiores mercados consumidores do mundo, com mais de 200 milhões de “clientes”, além de ainda ter grande espaço para aumento do consumo per capita.

Do lado da produção, também temos a faca e o queijo na mão. Temos área, água, alimento, tecnologia, genética, estrutura e gente boa para dar saltos significativos de eficiência e produtividade.

 

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MilkPoint Mercado

 

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JOEDSON SILVA SCHERRER

CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM - ESPÍRITO SANTO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 06/06/2024

Parabéns pela análise. Muito realista. Admito que o grande vilão que enfrentamos em relação ao consumo per capta está relacionado à condição financeira da sociedade brasileira. Quem não teve grandes perdas na sua capacidade de compra?
MATHEUS NAPOLITANO

UBERLÂNDIA - MINAS GERAIS

EM 07/06/2024

Olá, Joedson!

Obrigado pela participação.

Realmente, o poder de compra da população para todos os produtos (inclusive para os lácteos) é um grande desafio.

Abraços!
PAULO FERNANDO ANDRADE CORREA DA SILVA

VALENÇA - RIO DE JANEIRO - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 05/06/2024

Estabilidade através de contratos indexados como o da Aplisi e dos 100 maiores produtores do Brasil, que só fazem crescer, ambos!
A resistência da grande indústria a esses contratos, algumas vezes apoiada pela mídia digital, é absolutamente míope, não contribuindo para a produção de leite no Brasil.
MATHEUS NAPOLITANO

UBERLÂNDIA - MINAS GERAIS

EM 05/06/2024

Olá, Paulo!

Como abordado no artigo, a volatilidade do preço do leite é um desafio até maior do que o preço em si. Com certeza, ferramentas que tragam maior previsibilidade poderá contribuir para os diferentes elos.

Obrigado pela participação. Abraços!

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