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Para onde caminha a ciência de proteína e AA para vacas leiteiras?

MARINA A. CAMARGO DANÉS

EM 24/07/2024

9 MIN DE LEITURA

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Todos os anos a sociedade científica global se reúne em um dos maiores congressos sobre bovinocultura leiteira do mundo, a reunião da American Dairy Science Association, o ADSA. Mais de mil pessoas, entre pesquisadores, estudantes, professores, e profissionais da indústria dedicam três dias a uma imersão em que as pesquisas mais recentes e os assuntos mais relevantes para o setor são apresentados e discutidos. Essa conexão entre academia e indústria, entre pesquisadores e técnicos, entre estudantes e professores, gera um valor imensurável para a produção de leite no mundo.

Este ano a reunião aconteceu entre 16 e 19 de junho e eu tive a oportunidade de participar. Além de apresentar resultados dos trabalhos conduzidos pelo nosso grupo, pude também acompanhar as pesquisas mais recentes na área de proteína e aminoácidos (AA) para vacas leiteiras. Compartilho aqui com vocês algumas das coisas que mais me chamaram atenção. O texto é um pouco longo (por isso foi dividido em duas partes) e os assuntos são diversos, mas se você é como eu, apaixonada por nutrição proteica, pegue seu café e aproveite.

A primeira observação interessante é que a abordagem da nutrição proteica migrou definitivamente de proteína bruta para nitrogênio ruminal e AA. Isso faz todo sentido, já que proteína bruta é uma classificação genérica que não traz informações suficientes sobre o tipo de nitrogênio que está na dieta, nem seu comportamento ruminal. Falando sobre AA, o AA que continua recebendo maior atenção é a metionina. Dois novos produtos de metionina protegida da degradação ruminal (MetPR) foram apresentados, com resultados positivos sobre caracterização (1405 - Danese et al.; 2187 - Drehmel et al.), biodisponibilidade (2470 - Whitehouse et al.) e desempenho animal (1406 - Danese et al.).

A metionina, além de ser o AA comumente mais deficiente em dietas de vacas leiteiras, também atua em diversas outras funções do metabolismo, como no sistema imune, sinalização celular e epigenética. Por isso, as pesquisas têm adotado cada vez mais uma visão integrada entre nutrição e saúde, explorando além dos resultados de desempenho, variáveis metabólicas e fisiológicas, e também respostas em situações de desafio. A situação de desafio mais estudada com MetPR é o período de transição, mas recentemente o estresse por calor também tem recebido atenção. Inclusive esse foi um dos trabalhos que o INPPAR (Inovação, Pesquisa e Pessoas para Alimentação de Ruminantes), meu grupo de pesquisa, levou para apresentar na reunião.

Nosso estudo suplementou vacas primíparas da raça Holandês com MetPR durante o verão em uma fazenda comercial no sul de MG por 9 semanas. Nossa hipótese era de que a metionina atenuaria os efeitos deletérios do estresse por calor nos animais, especialmente relacionados ao estresse oxidativo. Ao contrário do que esperávamos, as vacas recebendo MetPR apresentaram maior frequência respiratória e temperatura corporal do que as vacas controle (2467 - Monteiro et al.). Isso aconteceu porque as vacas suplementadas com MetPR produziram mais leite e mais sólidos do que as vacas do controle (+1,5 kg/d de leite corrigido para energia; 2041 - Oliveira et al.). Avaliamos também o perfil de ácidos graxos do leite (2577 - Monteiro et al.) e observamos uma interação entre as semanas do experimento e os tratamentos. Ao compararmos a semana 9 com a semana 3, a % de ácidos graxos totais, pré-formados (<16 carbonos) e mistos (16 carbonos), aumentou para as vacas do tratamento MetPR e não para as do controle. Vale ressaltar que a semana 9 foi a mais quente do experimento. Ainda estamos analisando os resultados de parâmetros metabólicos para avaliar se o melhor desempenho das vacas com MetPR foi decorrente da atenuação dos efeitos negativos do estresse por calor.

A professora Jimena Laporta, da Universidade de Wisconsin, apresentou os resultados de um experimento em que o estresse por calor foi induzido durante o período de transição com uso de cobertores elétricos. O grupo de vacas submetido ao estresse por calor foi dividido entre dieta controle ou dieta suplementada com MetPR. Dentre as vacas em estresse por calor, as que receberam MetPR produziram leite com maior teor de proteína e sólidos totais do que as do controle (Davidson et al., 2023), e apresentaram melhor saúde hepática (Guadagnin et al., 2023), revertendo parte dos efeitos negativos do calor. Esses dados foram apresentados na reunião do ano passado. Esse ano, os resultados apresentados foram das bezerras que estavam sendo gestadas por essas vacas durante o experimento (1608 - Larsen et al.). O estresse por calor reduziu o peso ao nascimento, a absorção de imunoglobulinas do colostro, a concentração de AA na circulação e afetou a expressão gênica no fígado de 286 genes responsáveis por importantes funções biológicas na vida do neonato. A MetPR não foi capaz de reverter esses efeitos negativos na bezerra, reforçando a importância do resfriamento das vacas no período pré-parto.

Falando agora sobre período de transição, gostaria de comentar 3 dos trabalhos apresentados. O primeiro é da Universidade de Illinois (2189 - Efil et al.) e avaliou o balanceamento de AA somente no pós-parto (até 63 dias em lactação). Uma dieta controle, com aportes de Met e Lis metabolizáveis de 45 e 137 g/d (Lis:Met = 3,06, tratamento CON), foi suplementada com MetPR para atingir 53 g/d de Met metabolizável (Lis:Met = 2.61, tratamento MET), ou com MetPR e lisina protegida da degradação ruminal (LisPR) para atingir 53 g/d de Met e 162 g/d de Lis metabolizáveis (Lis:Met = 3,04, tratamento ML), ou com MetPR e LisPR para atingir 62 g/d de Lis metabolizáveis (Lis:Met = 2.61, tratamento HML). Durante as 4 primeiras semanas de lactação, as vacas do tratamento ML produziram mais leite corrigido para energia do que o controle (38,0 L/d vs 31,6 L/d) enquanto os tratamentos MET e HML foram intermediários (35,5 L/d para MET e 32,8 L/d para HML). Apesar de não significativo, houve um comportamento similar à produção de leite no consumo de MS para os tratamentos, resultando na mesma eficiência alimentar para todos os grupos. No entanto, a diferença entre tratamentos desapareceu nas semanas 5 a 9 de lactação. O resultado positivo não foi decorrente da relação lis:met, que era melhor no tratamento HML do que no ML e não proporcionou melhores resultados. A resposta parece ter vindo de quantidades adequadas dos dois aminoácidos nesse período, mas o efeito de curto prazo precisa ser melhor entendido.

O segundo trabalho sobre período de transição é brasileiro e foi realizado pelo grupo do Prof. Rodrigo de Almeida, da UFPR (2185 - Viana et al.). Ao contrário do trabalho anterior, este avaliou diferentes suplementações somente no período pré-parto. As 214 vacas receberam ou não MetPR nas 3 semanas pré-parto e todas as vacas receberam MetPR até três semanas pós-parto. A suplementação não afetou peso ao nascimento dos bezerros, qualidade de colostro, transferência de imunoglobulinas (brix sérico dos bezerros), nem níveis de betahidroxibutirato ou glicose das vacas no pós-parto. A produção de leite das vacas suplementadas com MetPR no pré-parto foi, na média geral do grupo de vacas, 1,9 L/d menor do que a do grupo controle. No entanto, como o grupo suplementado produziu leite com maior teor de proteína do que o grupo controle, o leite corrigido para energia foi igual para os dois tratamentos. O mais interessante, no entanto, foi uma interação entre paridade das vacas e tratamento para produção de leite. Não houve diferença significativa na produção de leite entre os tratamentos para as vacas de primeira lactação (31,2 e 33,1 L/d para MetPR e controle) nem para as de 3 ou mais lactações (45,7 e 43,6 L/d para MetPR e controle). No entanto, as vacas de segunda lactação suplementadas com MetPR produziram menos leite do que as vacas controle (39,6 x 46,3 L/d). O motivo desse resultado inesperado não está claro, mas ressalta a importância de avaliarmos individualmente os grupos de diferentes paridades.

O terceiro trabalho sobre período de transição abordou a interação entre a suplementação com AA e com niacina (NiaPR) protegidos da degradação ruminal entre 28 dias pré-parto e 28 dias pós-parto. Duzentas vacas multíparas da raça Holandês foram divididas em 8 baias e as baias distribuídas entre 4 tratamentos: 1) controle, sem nenhuma suplementação de AA ou niacina (CON), 2) dieta controle com suplementação de MetPR e LisPR (AAPR), 3) dieta controle suplementada com NiaPR, 4) dieta controle suplementada com AAPR e NiaPR (AA-NiaPR). Não houve efeito dos tratamentos no consumo pré-parto, mas os dois tratamentos suplementados com NiaPR consumiram menos no pós-parto do que o grupo controle. Apesar disso, o tratamento AA-NiaPR aumentou a produção e concentração de gordura e a concentração de proteína no leite. Essa interação entre AA e vitaminas do complexo B vem recebendo mais atenção recentemente e faz todo sentido do ponto de vista das fisiologia dos animais, já que esses nutrientes têm muitos pontos de conexão em suas rotas metabólicas.

Na segunda parte do artigo vou comentar resumos sobre histidina, sobre papéis funcionais dos AA e sobre ingredientes proteicos. Fiquem de olho! Gostaria de aproveitar o assunto de pesquisas com nutrição proteica para convidar todas as pessoas que formulam dietas para vacas em lactação a participarem de um projeto de pesquisa que meu grupo está conduzindo. Nós acreditamos que apesar da grande evolução da ciência da nutrição proteica de vacas leiteiras, o avanço só será percebido na cadeia produtiva se existir uma boa transferência dessas tecnologias para o campo, neste caso para os nutricionistas. É fundamental entender quais são os desafios práticos de quem formula dietas para vacas em lactação e como estes desafios podem se tornar barreiras para a adoção de modelos nutricionais mais sofisticados. Para isso, estamos realizando um levantamento por meio de um questionário online que leva aproximadamente 30 minutos para ser respondido.

O objetivo do projeto é entender o contexto, os desafios, as referências e as ferramentas utilizadas pelos nutricionistas nas fazendas leiteiras para que, a partir disso, possamos repensar nossas linhas de pesquisa e nossas estratégias de popularização do conhecimento para, assim, gerar mais valor para essa cadeia produtiva. Peço que dediquem um pouco do seu tempo para participar e contribuir com a nutrição proteica no Brasil. Clique aqui  para acessar o questionário. Muito obrigada!


 

Todos os resumos podem ser acessados no Abstract Book (link abaixo). Os números dos resumos, primeiro autor e título estão nas referências deste texto.

https://www.adsa.org/Portals/0/SiteContent/Docs/Meetings/2024ADSA/Abstracts_BOOK_2024_FINAL.pdf

 

1405 - Danese et al. Development and characterization of a sustainable encapsulated methionine source.

2187 - Drehmel et al. Evaluation of rumen undegradable protein and intestinal digestibility on a new commercial rumen-protected methionine product.

2470 - Whitehouse et al. Further evaluation of RPMet™ using the plasma amino acid dose-response method.

1406 - Danese et al. Evaluation of a rumen-protected methionine product to improve amino acid balance in lactating cows.

2467 - Monteiro et al. Effect of rumen-protected methionine supplementation on vaginal temperature and respiration rate in lactating cows during summer.

2041 - Oliveira et al. Response of mid-lactation Holsteins cows to the supplementation of rumen-protected methionine during the summer.

2577 - Monteiro et al. Effect of rumen-protected methionine supplementation on milk fatty acids profile of Holsteins lactating cows during the summer.

1608 - Larsen et al. Supplementation of rumen-protected methionine to late-gestation heat-stressed cows: Impact on calf amino acid metabolism and liver gene expression.

2189 - Efil et al. Rumen-protected amino acids for fresh cows.

2185 - Viana et al. Effects of prepartum supplementation of rumen-protected methionine on productive performance in transition dairy cows.

 

MARINA A. CAMARGO DANÉS

Professora do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Lavras. Engenheira Agrônoma e mestre pela ESALQ/USP. PhD em Dairy Science pela Universidade de Wisconsin-Madison, WI, EUA. www.marinadanes.com

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JORGE AUGUSTO ABREU

FRANCISCO BELTRÃO - PARANÁ - INDÚSTRIA DE INSUMOS PARA A PRODUÇÃO

EM 31/07/2024

Excelente professora.
A proteína ainda pesa muito no custo/dia da vaca, e entendermos as reais respostas sobre a suplementação de aa em produção e saúde da vaca, se faz necessário, e será o caminho.
Obrigado pela excelente síntese.

Jorge Abreu. Grupo Safeeds
RODRIGO DE ALMEIDA

CURITIBA - PARANÁ - PESQUISA/ENSINO

EM 29/07/2024

Excelente Marina; obrigado por compartilhar este resumo de forma tão didática! Leitura obrigatória para todos que gostam e trabalham com nutrição proteica de vacas leiteiras!

Prof. Rodrigo de Almeida, UFPR
MARINA A. CAMARGO DANES

LAVRAS - MINAS GERAIS - PESQUISA/ENSINO

EM 29/07/2024

Oi Rodrigo, muito obrigada pelo seu comentário e feliz que você gostou!
Um abraço,
Marina

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