Dada a importância da relação entre CCS do leite e os seus potenciais riscos à saúde humana, foi promovido um amplo debate sobre o tema no Encontro Anual do NMC (National Mastitis Council) - 2005. Diversos países, incluindo o Brasil, possuem na sua legislação limites máximos para a CCS do leite do tanque para o consumo, sendo que existe certa tendência de que estes limites sejam reduzidos ao longo do tempo. Um dos exemplos atuais deste debate ocorre nos EUA, onde o limite de 750.000 cel/ml é questionado e busca-se a sua redução e adequação ao mesmo nível dos países da União Européia (400.000 cel/ml).
Baseando-se em extensa revisão dos trabalhos científicos sobre o assunto, não foi encontrada relação direta entre e o consumo de leite pasteurizado com elevada CCS e riscos conhecidos à saúde humana. É importante destacar que as células somáticas são essencialmente compostas por leucócitos e células de descamação da glândula mamária. Durante a mastite ocorre a elevação das células somáticas do leite, resultando em aumento da percentagem de leucócitos em relação ao total de células. Baseando-se neste conceito de células somáticas, os riscos do consumo de leite com alta CCS são aqueles ligados ao consumo de leucócitos, os quais não apresentam nenhum efeito negativo direto, que tenha sido documentado por pesquisas científicas.
A causa principal da elevação da CCS do leite é a ocorrência de infecções intramárias, as quais são causadas primariamente por bactérias. Pode-se, então, argumentar que muitas destas bactérias são também agentes causais de doenças em humanos, como por exemplo Escherichia coli, Staphylococcus aureus e S. agalactiae. No entanto, a pasteurização do leite elimina a quase totalidade dos agentes causadores de mastite, o que representa assim, uma das principais etapas para a prevenção da transferência de bactérias patogênicas da glândula mamária para o consumidor. A pasteurização do leite, obrigatória em muitos países, reduz o número de organismos viáveis, entretanto não atua sobre a concentração de toxinas produzidas pelos agentes causadores de mastite. Desta maneira, microrganismos produtores de toxinas resistentes ao calor são potenciais riscos em rebanhos com elevada quantidade de vacas infectadas. Exemplo disto são as enterotoxinas produzidas por S. aureus, as quais estão presentes no leite de vacas infectadas por este agente.
Outro risco real, ainda que indireto, da elevada CCS do leite sobre a saúde humana é a ocorrência de resíduos de antibióticos. Diversos estudos determinaram uma relação direta positiva entre a alta CCS do leite e a presença de resíduos de antimicrobianos . O consumo de leite com concentrações de resíduos acima do legalmente permitido é reconhecidamente danoso à saúde dos consumidores, principalmente aqueles alérgicos aos principais antibióticos utilizados. Deve-se salientar que este é um risco indireto, pois a ocorrência de resíduos no leite é maior nos rebanhos com CCS mais elevada, os quais são aqueles que mais utilizam tratamentos intramamários, e desta forma, apresentam maior probabilidade de terem resíduos no leite. Para eliminar o problema dos resíduos, deve-se utilizar de forma criteriosa os antibióticos em vacas em lactação e respeitar rigorosamente o período de carência dos medicamentos.
Em síntese, de acordo com extensa base científica analisada, o consumo de leite com alta CCS não implica em risco direto ou específico à saúde humana, desde que pasteurizado. Por outro lado, existe sim uma relação entre a elevada CCS do leite e as condições higiênicas inadequadas e a presença de resíduos de antibióticos no leite. Portanto, não existe atualmente um modelo definido que estabeleça uma redução de risco à saúde dos consumidores pela redução da CCS do leite, ainda que a diminuição da CCS esteja implicada positivamente com outros aspectos de qualidade, como a composição do leite.
Fonte: Anais do Encontro Anual do NMC, p. 73-75, 2005.