No Brasil, com o objetivo de melhorar a qualidade do leite, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) publicou a instrução normativa 51 (IN51) que regulamenta normas para qualidade do leite e de seus derivados, produção, identidade e qualidade de leites tipos A, B, C, pasteurizado e cru refrigerado, além de regulamentar a coleta de leite cru refrigerado e seu transporte a granel.
A análise laboratorial mais utilizada para monitorar a qualidade microbiológica do leite cru é a contagem padrão em placas (CPP) ou contagem bacteriana total (CBT). A CBT quantifica o número total de bactérias presentes no leite cru, mas não identifica grupos específicos de bactérias que se proliferam quando há falhas nos processos de produção, ordenha e armazenamento. A CBT é realizada em procedimento de contagem padrão em placas com incubação de 48 horas a 32°C e também pode ser realizada por meio de contadores eletrônicos baseados em citometria de fluxo. As exigências para CBT regulamentadas na IN51 estão descritas a seguir:
Tabela 1. Limites máximos de contagem padrão em placas para o leite cru resfriado no Brasil (1 análise mensal, com média geométrica sobre o período 3 meses).
Além da CPP, outras análises podem ser utilizadas para avaliar a qualidade do leite, como a contagem com incubação preliminar (CIP), contagem de leite pasteurizado (CLP) e contagem de coliformes (CC). A CIP é usada para estimar o grupo de bactérias psicotróficas, as quais se multiplicam em condições de refrigeração, sendo que a sua presença reflete condições inadequadas de temperatura e higiene no armazenamento do leite. A CLP quantifica o grupo de bactérias denominadas termodúricas, as quais sobrevivem ao processo de pasteurização (63°C por 30 minutos). As bactérias termodúricas podem causar alterações no sabor e tempo de prateleira dos produtos lácteos. A CC é utilizada em programas de qualidade como indicador de contaminação fecal, a partir do solo, cama dos animais e água contaminada. A contaminação por coliformes ocorre principalmente pela parte exterior do úbere e tetos dos animais e equipamentos de ordenha.
A qualidade microbiológica do leite cru está envolvida com diversos fatores como a saúde e higiene da vaca, higiene durante o processo de ordenha e dos equipamentos de ordenha, além do tempo e da temperatura adequados de armazenamento. Por estes fatores, para monitorar e melhorar a qualidade microbiológica do leite cru é possível utilizar ferramentas como a análise do leite de tanque de expansão, desde que, durante o processo de interpretação dos resultados, haja associação entre os resultados laboratoriais e informações sobre as práticas de manejo da fazenda leiteira.
Na região de Viçosa - MG, um grupo de pesquisadores (Nero et al., 2009) realizaram um estudo onde estabeleceram uma relação entre práticas higiênicas de ordenha e a qualidade microbiológica do leite. Para tanto, os pesquisadores aplicaram questionários abrangendo questões sobre características do rebanho e produção, procedimentos higiênicos durante a ordenha e com os animais (vacinação e controle de enfermidades), e coletaram amostras de leite para enumeração de bactérias aeróbias mesófilas e psicotróficas (microrganismos capazes de se multiplicar em temperaturas ótimas na faixa de 30 a 45°C e 25 a 30°C respectivamente).
Os autores verificaram que os produtores da região adotam várias práticas higiênicas - mais frequentes em fazendas com produção de leite superior a 100L de leite -, que o reflexo dessas práticas foram as baixas contagens de microrganismos aeróbios mesófilos e psicotróficos, e que a refrigeração representa uma importante ferramenta para manter a qualidade do leite (Figura 1).
Figura 1. Médias de contagens de microrganismos aeróbios mesófilos e psicotróficos em leite cru considerando diferentes práticas higiênicas adotadas durante a ordenha e conservação. Em cada gráfico, valores médios com letras diferentes indicam diferenças significativas (Tukey, p < 0,05). Fonte: Nero et al. (2009)
Fonte: Elmoslemany et al. Journal of Dairy Science 92, 2644-2652 (2009)
Nero et al. Ciência e Tecnologia de Alimentos 29 (2), 386-390 (2009).